sexta-feira, 23 de outubro de 2009

obstinação



«Para guardar os livros, Cosimo ia construindo uma espécie de biblioteca suspensa, o mais possível resguardada da chuva e dos roedores. Mas mudava constantemente os livros de lugar, segundo os estudos e gostos do momento, porque ele considerava os livros um pouco como se fossem aves e não queria, assim, vê-los fechados ou engaiolados, afirmando que semelhante espectáculo só servia para o entristecer (…).

E se, nos últimos tempos, à força de passar a vida metido entre os livros, andava um pouco com a cabeça entre as nuvens, cada vez menos interessado pelo mundo que o rodeava, agora, em vez disso, a leitura da Enciclopédia e certas palavras lindíssimas como: Abeille, Arbre, Bois, Jardin, faziam-no descobrir em todas as coisas que o cercavam aspectos totalmente novos»


«Entre os livros que mandava vir começavam a figurar até alguns tratados práticos, por exemplo tratados práticos de arboricultura (…). Aprendeu, assim, a arte de podar as árvores e oferecia os seus préstimos aos cultivadores de pomares (…). Em resumo, o amor que sentia por aquele seu elemento arbóreo soube torná-lo, como sempre acontece com todo o verdadeiro amor, até um pouco desapiedado e doloroso, um amor que fere e corta cerce, mas com a nobre intenção de fazer crescer e dar forma às árvores.»

O Barão Trepador, Italo Calvino, Teorema

( as ilustrações são de Yan Nascimbene para Le baron perché, Editions du Seuil, 2005)

2 comentários:

Saki disse...

Que lindo, Leonor, obrigada ;)

leonor disse...

confesso a vontade de também eu trepar a uma árvore assim e na quietude dos ramos ficar tão somente a olhar.